'Tarifaço' de Trump pode impulsionar importação de produtos chineses para o Brasil e afetar indústria nacional
Especialistas alertam que a entrada de mais produtos chineses pode reduzir preços a curto prazo, mas trazer desafios para a indústria brasileira a longo prazo.
Por Plox
22/02/2025 14h27 - Atualizado há 3 meses
A escalada da guerra comercial entre Estados Unidos e China pode transformar o Brasil em um destino ainda mais atrativo para produtos chineses. A recente sinalização do ex-presidente Donald Trump sobre a imposição de novas tarifas a produtos chineses importados pelos EUA preocupa a indústria brasileira, que vê o risco de uma concorrência desequilibrada aumentar nos próximos meses.

No final de janeiro, Trump anunciou uma tarifa adicional de 10% sobre os produtos chineses que entram nos EUA. Em resposta, a China adotou medidas semelhantes, elevando taxas sobre produtos americanos. Diante desse cenário de atrito comercial, especialistas indicam que a China pode buscar expandir sua presença em mercados alternativos, como o Brasil.
O fenômeno não é inédito. Segundo Marcos Jank, professor do Insper, a China já vinha adotando uma postura estratégica em meio às disputas comerciais, planejando seus próximos passos de forma cautelosa para não depender excessivamente dos EUA. Em 2024, os produtos chineses representaram 24,2% das importações brasileiras, número que pode crescer ainda mais.
Para os consumidores, essa maior presença de produtos chineses pode significar preços mais baixos em diversas categorias, pois a concorrência pressionaria a indústria nacional a reduzir custos para manter a competitividade. No entanto, representantes do setor industrial alertam para os riscos a médio e longo prazo.
José Velloso, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), aponta que o faturamento do setor já apresentou queda de mais de 8% em 2024, enquanto as importações cresceram 10% no mesmo período. Entre esses importados, o volume de produtos chineses teve um salto de 33%.
Os impactos também são sentidos em outras áreas, como o setor têxtil, que tem enfrentado uma intensa disputa de mercado com o avanço de plataformas de e-commerce chinesas, como Shein, Shopee e AliExpress. O “imposto das blusinhas”, criado em agosto passado para taxar em 20% compras internacionais de até US$ 50, surgiu como uma tentativa de equilibrar a competição para fabricantes brasileiros, mas os desafios permanecem.
Além da pressão exercida pelos produtos chineses, a valorização do dólar frente ao real, impulsionada pelas políticas tarifárias dos EUA, pode elevar o custo de produção no Brasil. Indústrias que dependem da importação de matérias-primas podem enfrentar aumentos nos custos, o que impactaria também o mercado de crédito e setores como a indústria automobilística.
O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Marcio de Lima Leite, observa que as vendas financiadas caíram para 30% em 2023, encerrando o ano passado em 45% do total. Se a valorização do dólar continuar, o acesso ao crédito pode se tornar mais restrito, impactando ainda mais o consumo.
A longo prazo, economistas avaliam que o aumento da presença de produtos chineses no Brasil pode desencadear problemas estruturais, como a desaceleração de investimentos e o aumento da taxa de desemprego. O setor de fabricação de geradores eólicos, por exemplo, que já teve sete fabricantes no país, atualmente conta com apenas três, refletindo um movimento de retração na indústria nacional.
Diante desse cenário, representantes do setor defendem que o Brasil precisa fortalecer sua competitividade internacional. Para Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), não basta apenas adotar medidas para equilibrar a concorrência com produtos chineses; é fundamental ampliar a presença brasileira no comércio global.
Os próximos meses ainda reservam incertezas sobre os desdobramentos da política tarifária dos EUA e seus efeitos sobre o Brasil. Apesar dos desafios, especialistas apontam que o país pode se beneficiar da reconfiguração do comércio internacional, fortalecendo relações estratégicas com outros mercados e ampliando sua capacidade de exportação.
“Ainda há oportunidades importantes para a indústria brasileira, desde que tenhamos estratégias bem definidas para fortalecer nossa competitividade no exterior”, conclui Leite, da Anfavea.